quarta-feira, 21 de maio de 2014

LE BERNARDIN (Comendo em Nova York – Parte 2/4)

Em muitos aspectos, Nova York se parece com São Paulo. Da mesma forma que podemos afirmar que a capital paulista é a "Meca" da gastronomia no Brasil, podemos dizer que a Big Apple o é em relação aos Estados Unidos. São milhares de food trucks vendendo hot-dogs, pretzels, waffles e raspadinhas; docerias produzindo os mais belos e saborosos cookies e cupcakes; lanchonetes que cultuam o fast food espalhadas por todos os cantos da cidade (todos!); e restaurantes que se dedicam as mais diversas cozinhas mundiais. Diante de tantas opções, se torna uma tarefa quase impossível escolher quais estabelecimentos conhecer.
No meu processo de seleção, decidi que queria visitar um restaurante sofisticado, cujo padrão de excelência fosse mundialmente reconhecido. Aí, surgiu a dúvida: "qual?".

1. A ESCOLHA DO LE BERNARDIN
Não foi uma decisão fácil, pois alguns dos melhores restaurantes do mundo estão concentrados em Nova York, dentre eles: “Eleven Madison Park”, “Le Bernardin”, “Per Se” e “Daniel” (só para citar os que figuram na lista “The World’s Best 50 Restaurants” de 2014).
Alguns livros me auxiliaram nesta empreitada. Vejamos, então, o que dizia cada um deles:
“Le Bernardin – Presença permanente na seleção dos melhores chefs de Nova York, o franco-americano Eric Ripert comanda a cozinha do Le Bernardin, um templo da elegância que começou a revolucionar a culinária de frutos do mar na década de 1980. Pouco temperados, ligeiramente cozidos ou apenas crus, seus pratos sempre diferentes surpreendem até os mais exigentes apreciadores da boa mesa.” (“1.000 lugares para conhecer antes de morrer”, Patricia Schultz, Rio de Janeiro: Sextante, 2006, pág.: 328.)
“Le Bernardin (...) Considerado um paraíso para amantes de frutos do mar, o Le Bernardin é um dos poucos estabelecimentos em NY a merecer quatro estrelas do NY Times, além de ser considerado o melhor da cidade pelo guia Zagat.” (“O melhor guia de Nova York”, Pedro Andrade, Rio de Janeiro: Rocco, 2013, págs.: 90/91.)  
“Em 2006, na edição de estreia do Michelin de Nova York, o Le Bernardin foi um dos únicos restaurantes a obter as três estrelas e as mantém até hoje, como mantém há 22 anos consecutivos as quatro estrelas do NYT.” (“Guia dos guias”, Ricardo Amaral e José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, Rio de Janeiro: Casa da Palvra, 2013, pág.: 117.)
Numa cidade que se metamorfoseia com a mesma rapidez que uma borboleta, com novos empreendimentos gastronômicos sendo lançados a todo momento, resta ao tempo funcionar como fator de seleção natural dos bons restaurantes. Deste modo, a tradição consolidada pelo Le Bernardin, aliada às excelentes avaliações que recebe, fez com que eu optasse por ele, ainda que eu não seja muito fã de frutos do mar (decisão audaciosa! rsrsrs).    

2. A RESERVA
Com a decisão tomada, minha “preocupação” passou a ser outra: conseguir fazer a reserva.
Entrando no site da casa, descobri que poderia fazer a reserva pelo site “Open Table”, com 30 dias de antecedência. Resolvi que jantaríamos lá na terça-feira, dia que julguei ser mais fácil de conseguir o agendamento. Queria marcar às 20:00, o site indicou que o horário mais próximo do desejado seria 20:30. Aceitei e reservei. Quando a confirmação chegou no e-mail do meu marido, mal pude acreditar: “Eu iria jantar no Le Bernardin!”.
Eles são bem enfáticos quanto ao uso do paletó, sendo a gravata opcional. Avisam tal necessidade no site da reserva e no e-mail de confirmação.
Ah... detalhe muito importante! Ao contrário dos outros restaurantes, que também agendei pelo “Open Table”, o Le Bernardin exige confirmação da reserva dois dias antes do almoço ou jantar, através de e-mail ou telefone. Esqueci de enviar um e-mail no domingo. Na segunda, o Daniel ligou e confirmou. Mais uma vez, a telefonista avisou: “É obrigatório o uso de paletó!”.
Eu fiquei tão ansiosa que, na véspera, sonhei que chegava ao templo da gastronomia francesa usando calça jeans e, por isso, era impedida de entrar... Talvez você pense: “Que exagero!”, mas, pra mim, ir a um jantar desses é como se eu estivesse indo a um show de uma banda muito querida, pois eu sempre espero um grande espetáculo, orquestrado por um Chef preparado e experiente.

3. O GRANDE DIA
Chegamos com 10 minutos de antecedência e a hostess pediu que aguardássemos um pouco no lounge. Não tivemos nem tempo de escolher um drink ou aperitivo e já fomos encaminhados até a nossa mesa.
Confesso que a decoração me decepcionou um pouco. Não é que fosse feia, mas eu esperava algo mais sofisticado e pomposo. Entretanto, a “má impressão” durou pouco, pois, bastou que eu me sentasse e avistasse um deslumbrante sousplat (ou seria um prato?) na minha frente, com uma grossa borda prateada, cheia de baixos relevos dando a impressão de serem gotas de água, para ter a certeza de que seria uma noite especial.


O atendimento é primoroso, com garçons ágeis e atentos a todos os detalhes. Explicam tudo, servem as bebidas e as comidas com bastante manejo, trocam os talhares a cada mudança de prato e, caso o cliente suje a toalha (como aconteceu comigo, que deixei umas batatinhas com molho caírem na mesa), colocam um guardanapo branco por cima, assim, fica tudo limpo novamente. Muito zelo no trato com o cliente!
O “Mestre de Cerimônias” da nossa mesa nos entregou o cardápio aberto na página que apresentava o "Le Bernardin Four Course Prix Fixe" e nos explicou que se tratava de uma refeição composta de 4 pratos: “First course: almost raw” (primeiro prato: quase cru); “Second Course: barely touched” (segundo prato: “mal tocado”?); “Main Course: lightly cooked” (prato principal: levemente cozido); e, para finalizar, sobremesa.
Ao contrário dos famosos menus degustação, no cardápio de preço fixo ($ 135,00), havia uma infinidade de frutos do mar a serem escolhidos em cada “course”. Detalhe: deveríamos escolher todas as iguarias de uma só vez e, logo em seguida, começaria o desfile de comidas bem elaboradas, executadas e apresentadas.        
Só para informá-los, há no menu duas opções de degustação com os preços ainda mais elevados: a "Chef's Tasting", que serve 8 pratos ($ 198 por pessoa; com vinho: $ 336,00), e a "Le Bernardin Tasting", que prepara 7 pratos ($ 155,00 por pessoa; com vinho: $ 246,00). Nestes dois últimos casos, as comidas são pré-determinadas e todos da mesa terão que optar por ela (se só alguns quiserem, não será possível!). No cardápio, não há pratos para serem pedidos isoladamente. O comensal tem que escolher um dos “festivais”.
Não sei se o garçom não mencionou a existência desses outros menus porque o Chef Eric Ripert não estava na casa e é preciso que ele esteja presente para coordenar a preparação. Enfim... O fato é que, em 4 pessoas com gostos diferentes, o "Le Bernardin Four Course Prix Fixe" acabou se revelando uma opção mais “sadia”, possibilitando que cada um escolhesse o que queria comer.
Eu não vou me estender muito na descrição dos pratos com receio de cometer algum equívoco. As comidas eram tão sofisticadas, que eu não saberia descrevê-las adequadamente.
O "mimo do Chef" era composto de três elementos: um canapé com massa filo crocante, uma rodelinha de polvo (não gosto de polvo, mas provei esse e adorei! Consistência e sabor perfeitos!) e uma xicrinha de sopa de cenoura com gengibre (combinação harmônica e exótica).


Um garçom passou pela mesa carregando uma enorme cesta com os mais variados tipos de pães. A variedade era tão grande que nem consegui entender direito o sabor de cada um. Escolhi esses aqui:


Já falei que não sou uma grande apreciadora de frutos do mar, não foi? Por isso, sabendo que o primeiro prato seria servido praticamente cru (almost raw), me inspirei na culinária japonesa e pedi o salmão. Na louça branca, vieram lascas de salmão escocês, parecendo um carpaccio, com uma saladinha de pepino, um molho cítrico que foi acrescentado ao prato pelo garçom e rodelinhas de banana frita. Primeiro prato: aprovado!


Na segunda etapa, escolhi o “Bacalao” (posta fina de bacalhau grelhado, que se desmanchava na boca, coberta com salada de cebola e pimenta e finalizada com molho vinagrete).


De prato principal, selecionei a lagosta assada em panela com molho de vinho tinto. A parte do abdômen, que alguns chamam de cauda, veio em pedaços, acompanhada da casca. A casca já estava solta, acho que a utilizaram apenas para compor a decoração da iguaria. Detalhe: o garçom trouxe um pratinho para colocar as cascas. Mas o que mais me impressionou neste prato foi o fato deles terem tirado a casca da pinça/pata da lagosta e servido apenas a carne em perfeito estado. Quanto capricho!


Na hora mais doce da noite, pedi o mil-folhas de chocolate, cuja apresentação era coisa de cinema. Ao invés da tradicional massa folhada recheada com creme de chocolate, eles serviram uma torta com creme de chocolate ao leite e uns filetes de caramelo. Meu Deus!!! Eu passaria a noite me deliciando com esses filetes. Sensacionais!!! Já o creme de chocolate não me agradou muito.


Para finalizar, trouxeram, para cada comensal, um pratinho contendo um praliné, um macaron de damasco, um pedacinho de brownie de chocolate e um biscoitinho com uma geleia de chocolate em cima. Esse último (que na foto é o segundo) foi o meu preferido. Que coisa mais gostosa!!!


4. A COZINHA


Eu perguntei ao maître quantas pessoas trabalham na cozinha, ele me respondeu que 50 e indagou se eu gostaria de conhecê-la. Conhecer a cozinha do Le Bernardin? Claro que eu quero! Lá fui eu num tour privado...
A cozinha é bem grande e dividida por setores. Vejamos de trás para frente. No fundo, ficam os encarregados de prepararem os pratos que são servidos no lounge. Em seguida, fica a pâtisserie, onde são elaboradas as sobremesas e doces. No meio, são feitos os primeiros pratos da refeição completa, aqueles “praticamente crus”. Depois, encontramos os cozinheiros que fazem as comidas “barely touched”. E, por fim, num espaço maior, estão os responsáveis pelos pratos principais. Antes de chegar na porta, há um espaço para os garçons se locomoverem.
O nosso “guia turístico” nos mostrou, ainda, um quadro onde são controladas as refeições de todas as mesas, pois nada pode sair errado e tudo precisa acontecer no momento certo (perfect timing).   

5. CONCLUSÃO
Acho que, depois do tanto que falei, seria desnecessário dizer que eu, simplesmente, A-M-E-I a experiência. A experiência inteira!!!
E finalizo dizendo: se você pode se dar a esse luxo, ainda que seja apenas numa viagem ou numa ocasião especial, o faça! Reserve e vá a um restaurante Classe "A". A vida é muito curta e são momentos como esse que fazem com que ela valha a pena ;o)  


Para acompanhar toda a série “Comendo em Nova York”, segue abaixo o cronograma de posts:
2) LE BERNARDIN - Comendo em Nova York – Parte 2/4;




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